Ser filha não é fácil, eu que o diga, muitas responsabilidades, obrigações, ainda mais quando se é filha única, as preocupações são todas voltadas para você. Os pais geralmente são super protetores, os meus são um exemplo, querem saber onde estou, com quem, fazendo o que, a preocupação é sempre com as amizades, como no meu caso. Quando comecei a sair sozinha, começou a preocupação de meus pais para saber com quem a sua filha estava andando, se os seus amigos eram boas pessoas, se usavam drogas, mas, no mundo de hoje, são poucas as pessoas que não as usam. No meu ciclo de amigos, há pessoas que usam drogas, sim, e eu nunca escondi isso de meus pais, mas eles sempre falavam que, quando alguém estivesse utilizando drogas perto de mim era para eu me afastar.
Nesse ciclo de amigos, eu comecei a namorar um dos meninos, porém, antes de começar a namorar com ele, eu já o conhecia muito bem e sabia que ele estava passando por uma fase difícil, mas resolvi tentar do mesmo jeito. No começo, gostava apenas de ficar com ele, mas depois acabei me apaixonando. Foi muito difícil no início da relação, ele era uma pessoa um pouco complicada de se conviver por causa da irresponsabilidade e das manias. Com o tempo, fui aprendendo a lidar com tudo isso. Por ser um menino criado solto, sem a mãe do lado (a qual faleceu há alguns anos) não tinha limites, fazia o que bem queria e nunca teve alguém para lhe dizer o que era certo ou errado.
Quando a gente estava namorando, ele não aceitava quando eu dizia que o ele estava fazendo era errado, mas, no caso das drogas, eu era sempre a que falava demais e eu sabia o que estava falando, pois tinha uma base familiar, então eu enxergava muita coisa que ele não conseguia. Meus pais nunca o conheceram, apenas o viram poucas vezes, mas nenhum contato, porém já não foram com a cara dele desde a primeira vez que o viram, até que rolou um pequeno desentendimento entre eu, ele e meu irmão, nada demais, apenas fofocas. Desse dia em diante, meus pais me pediram para que eu me afastasse dele, porém não obedeci e continuei com ele, eu tinha esperança de que meus pais o conhecessem melhor e tirassem aquela má impressão, mas as coisas só pioraram, ele piorou, começou a tomar um rumo errado, além das drogas, o de roubo, coisa que ele e os outros meninos nunca precisaram, eram de classe média e nunca passaram fome nem nada, faziam apenas por adrenalina, como diziam os próprios.
Conselhos não faltaram para ele, sempre estive ao lado dele, mostrando-lhe outro caminho, teve um tempo que até melhorou, resolveu entrar na faculdade, trabalhar, mas esse momento durou pouco, ele e os outros amigos estavam ficando cada vez piores e tinham muitas coisas que eu não sabia e só vim a saber depois, quando a bomba estourou. Certo dia, mudou a vida desses meninos, os quais eram queridos entre a galera e os familiares, tinham um futuro pela frente, mas escolheram o caminho errado, caminho esse os que levou para o COP (Centro de Observação Penal), mudou a vida deles e a de muitas pessoas, principalmente a minha. Vi o sofrimento de uma mãe desesperada por ver seu filho preso, seu filho jovem, no começo da vida. Foi uma notícia chocante para a mídia por serem meninos de classe média, tentei esconder de meus pais, mas acabou sendo impossível, a notícia já estava em todos os jornais, na boca de todo mundo. Meus pais pediram para que eu não procurasse me envolver em nada, mas, mais uma vez, eu os desobedeci.
Resolvi ir visitar o meu namorado, escondido de meus pais, uma decisão que tomei depois de dois meses do acontecido. Assim que entrei no complexo penitenciário, pensei que era um pesadelo e que aquilo não estava acontecendo, mas era real e eu tinha feito a minha escolha de ir visitá-lo. No momento, não bateu arrependimento, pra falar a verdade, hora nenhuma bateu. Quando entrei no lugar, todos ficaram me olhando, os funcionários comentavam: o que essa menina está fazendo aqui, mas logo achavam respostas, sabiam que era amiga de um dos meninos de classe média. A pior parte é a revista, é muito constrangedora, conheci uma realidade diferente da que eu estava acostumada, me vi num lugar que jamais imaginava que estivesse mesmo não sendo um presídio grande e sim um centro de observação pude ver como é a vida de um presidiário, os seus pensamentos, os seus planos, o que fazem no dia-a-dia. Quando vi meu namorado não tive outra reação, além de chorar, senti uma coisa que não consegui explicar até hoje, conversamos bastante e prometi que voltaria e foi o que fiz, voltei. Em uma das visitas, tive contato com os outros meninos também, porém não tive reação, falei pouco com eles, o suficiente para perceber o sofrimento e arrependimento nos olhos de alguns deles.
As minhas visitas iam ficando cada vez mais freqüentes, fui a única do pessoal que andava com os meninos que foi visitá-los, muitos me procuravam para ter notícias. A cada manhã que eu chegava naquele lugar, eu encontrava com a mãe de um deles chorando antes de entrar, lamentando pelo seu filho, aquilo apertava meu coração. O meu namorado começou a enxergar a vida de outra maneira, começou a ver os seus erros, começou a dar valor para aqueles que sempre estiveram do seu lado. Eu fico com pena por ele ser muito jovem, mas sei que o que ele fez foi errado e que agora tem que arcar com as conseqüências, porque por falta de aviso é que não foi, se tivesse escutado o que algumas pessoas falaram, não estaria no lugar em que estava agora. Como a verdade sempre aparece, meus pais descobriram que fui visitá-lo e ficaram bastante decepcionados comigo, o clima em casa ficou muito mal e eles me pediram mais uma vez que esquecesse esse menino, desta vez, obedeci a eles, pelo menos tentei, nunca mais fui visitá-lo, mandei uma carta explicando tudo que aconteceu e ele entendeu a minha situação.
Meus pais podem me proibir de ir vê-lo, mas não de sentir o que sinto por ele, um amor que não sei explicar, pois já tentei esquecê-lo e não consigo. Sinto falta dos meninos, há dias que a saudade bate muito forte e aí o choro é inevitável. Saudades de um tempo que não volta mais, pois nada será como antes, ficará marcado na vida desses meninos o erro pelo resto da vida. Eles se arrependem, mas têm que pagar pelo que fizeram. Acredito que isso serviu de lição para muitos jovens que acham que, por terem dinheiro, nunca acontecerá nada com eles. Os meus amigos pensavam isso, e se enganaram, meses passam e eles continuam no mesmo lugar e eu com o mesmo sentimento dentro de mim: um amor impossível, meus pais nunca aceitarão esse relacionamento, nem que passe anos, apenas se eu já estiver com minha independência, porém eles nunca vão concordar. Entendo o lado deles também, nenhum pai gostaria de ver sua filha envolvida com um presidiário. Vejo que a vida não é fácil, que as nossas atitudes valem muito e espero que um dia tudo mude para melhor.
Mayara Lopes